O BRICS diante dos conflitos contemporâneos por Albert Selmikat

O ano de 2025 revela um cenário global tenso. A guerra entre Rússia e Ucrânia, os impasses em Taiwan, o embate entre Índia e Paquistão, os conflitos no Oriente Médio e os ataques no Mar Vermelho expõem os limites da diplomacia.
Um mundo em crise e a reação dos grandes blocos
O ano de 2025 revela um cenário global tenso. A guerra entre Rússia e Ucrânia, os impasses em Taiwan, o embate entre Índia e Paquistão, os conflitos no Oriente Médio e os ataques no Mar Vermelho expõem os limites da diplomacia. Rebeldes Houthis do Iêmen seguem atacando navios comerciais desde o fim de 2023, mesmo após o cessar-fogo de maio de 2025.
Nesse contexto, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) passou por expansão, acompanhada por um aumento nos orçamentos militares de diversos países europeus e por um aquecimento expressivo no mercado global de armamentos. Tais movimentos refletem um cenário internacional mais instável e orientado à segurança. Em paralelo, o BRICS ampliado, agora com 11 países, também responde a essa conjuntura com iniciativas que combinam reforço de capacidades defensivas e esforços diplomáticos, cada um à sua maneira.
Divergências internas e realidades assimétricas no BRICS
O bloco abriga países com contextos muito distintos. Alguns estão diretamente envolvidos em guerras, outros atuam como mediadores ou ampliam sua base de defesa. Essa diversidade limita iniciativas conjuntas na área de segurança, mas também permite formatos flexíveis de diálogo.
Situações nacionais e regionais
Vamos agora analisar alguns cenário dos países BRICS.
Brasil – não envolvido em ações externas, o país lançou a Operação Atlas, reforçando a presença militar na fronteira norte após movimentações venezuelanas, no contexto da disputa entre Venezuela e Guiana. Também intensificou os investimentos na Base Industrial de Defesa, com foco na produção de mísseis, blindados e sistemas de monitoramento.
Irã – ampliou em 200% seu orçamento de defesa em 2025, priorizando mísseis e defesa antiaérea. Apesar da reaproximação com a Arábia Saudita, o conflito no Iêmen persiste. Os Houthis, apoiados por Teerã, atuam em guerra por procuração e mantêm controle territorial com hostilidade contínua.
Etiópia – permanece instável após o conflito em Tigray, com confrontos esporádicos e tensões com a Eritreia. Apesar de orçamento militar modesto, destina parte relevante de seus recursos à segurança interna e de fronteiras, com atenção de organismos multilaterais.
Arábia Saudita – restabeleceu laços com o Irã em 2023, com mediação chinesa entre os tradicionais rivais, e tem atuado como interlocutora em conflitos no Oriente Médio e África. Além de figurar entre os maiores compradores de armamentos, vem expandindo sua indústria de defesa com apoio internacional.
Egito – exerce papel de mediador no conflito israelense-palestino, promovendo cessar-fogos e ações humanitárias. Também moderniza seu arsenal com aquisições da Rússia, França e EUA, mantendo protagonismo diplomático regional.
África do Sul – retirou-se da missão da SADC (Comunidade de Desenvolvimento da África Austral) na RDC, mas continua ativa em iniciativas africanas de segurança. Apesar do orçamento limitado, mantém capacidade regional de projeção. O leste congolês segue instável.
Emirados Árabes Unidos – têm investido em sistemas autônomos e parcerias estratégicas. Além de importar tecnologias avançadas, o país direciona recursos à construção de uma base industrial de defesa com projeção global. Também ampliou sua atuação diplomática, participando de mediações como as trocas de prisioneiros entre Rússia e Ucrânia. No Brasil, detêm participação acionária em empresa da indústria de defesa envolvida em sistemas de mísseis navais, com perspectivas de expansão futura para outros setores tecnológicos e industriais ligados à segurança estratégica.
Indonésia – coopera com o Brasil e participa de exercícios no Indo-Pacífico, priorizando segurança marítima. Seus investimentos crescem em áreas como patrulhamento naval e resposta a ameaças assimétricas.
Produção e circulação de armamentos
Rússia e China lideram a produção militar no bloco, desempenhando papéis centrais tanto em capacidades nacionais quanto em exportações. A Rússia fornece sistemas de defesa para parceiros como China, Irã e Índia, mantendo relações estratégicas de longa data. Por sua vez, a China tem ampliado suas exportações para regiões como Ásia, África e Oriente Médio, consolidando sua presença no mercado global.
A Índia, embora ainda dependente de fornecedores externos, vem fortalecendo sua base industrial com apoio técnico e acordos bilaterais. Além disso, observam-se colaborações internas entre os membros do BRICS, como os vínculos tecnológicos entre Rússia e Irã, as parcerias em monitoramento espacial e comunicações entre China e Brasil, e os programas conjuntos entre Índia e Rússia.
Um bloco em construção
O BRICS não atua como aliança militar, mas seus integrantes influenciam diretamente zonas de conflito. A ausência de consenso em temas sensíveis limita sua eficácia coletiva. Em um cenário global marcado por incertezas, a solidez do BRICS dependerá menos da eliminação de suas diferenças e mais de sua habilidade de atuar de forma coerente onde houver convergência possível. O contexto é desafiador, mas não desfavorável — e essa ambivalência resume a natureza do bloco diante das tensões que o cercam.
* Albert Selmikat é pequisador associado ao CENEGRI. Meste em Inovação Tecnológica pela UNIFESP e consultor de Alta Tecnologia.